segunda-feira, 3 de junho de 2024

“Trovadorismo” análise feita para matéria de literatura portuguesa, lecionada pela professora Zilda Freitas, no quarto semestre de Letras, como avaliação da primeira unidade.

 

Uma visão sobre o trovadorismo e analise de cantiga

 

 O trovadorismo, movimento literário que floresceu na Europa medieval na Idade Média que reverbera a riqueza cultural e artística desse período. Portugal também foi palco de intensa atividade literária e cultural suas cantigas líricas e satíricas permeadas de sentimentos amorosos e corteses, revelavam a sensibilidade e a criatividade dos trovadores. Em meio ao contexto feudal e teocêntrico, as cantigas trovadorescas em terras portuguesas refletiam não apenas os valores cristões predominantes, mais também a influência árabe, na Península Ibérica. Assim a produção literária trovadoresca em Portugal se destacou pela fusão de diferentes influencias culturais que perdurou ao longo dos séculos.  

A perspectiva de Cid Seixas sobre a poesia trovadoresca galego-portuguesa oferece uma visão crítica desta tradição literária, considerando o seu significado histórico e cultural.  Seixas conheceu de perto as complexidades e nuances das cantigas de amor, de amigos, de escárnio e de maldizer, buscando compreender as variações e influências presentes nessa produção literária.

“As cantigas de amigo, que constituem o mais rico material poético da nossa tradição, são de origem popular. E esta forma galega de um homem compor uma cantiga para expressar o sentimento de uma mulher, como se fosse a própria mulher quem fala, é uma correspondente hispânica de um tipo de composição trazida pelos árabes”. (Seixas,1999 p. 28)

Uma das formas de Seixas oferecer uma visão crítica da poesia trovadoresca foi através da análise das diferentes formas de cantigas. Os seus trabalhos demonstram uma compreensão dos contextos sociais e culturais em que estas formas foram criadas e como foram usadas para expressar diferentes emoções e experiências. Por exemplo, a sua análise das cantigas de escárnio e de maldizer, de carácter crítico, evidencia o uso sofisticado da ironia e da sátira para comentar questões contemporâneas. O trabalho de Seixas oferece uma compreensão crítica do papel da poesia trovadoresca na formação da paisagem cultural e literária de Portugal medieval e da Galiza. Ao examinar os elementos formais e temáticos presentes nesta tradição poética, revela a intrincada relação entre música e poesia e a forma como estas formas se influenciaram mutuamente ao longo do tempo. Demonstram também como a poesia trovadoresca contribuiu para o desenvolvimento da língua galego-portuguesa, que tem tido uma influência duradoura nos descendentes linguísticos desta região. Através da análise das diferentes formas de cantigas e do seu significado cultural, o autor proporciona uma compreensão mais profunda das complexidades e nuances desta tradição poética, demonstrando como ela continua a informar e a inspirar tanto os poetas como os académicos contemporâneos.

Já Carlos Castilho Pais foi de fato, um indivíduo multifacetado e talentoso. Sua contribuição para a literatura e a cultura é notável. A “Arte Poética” é uma obra que merece atenção, pois mergulha nas profundezas da criação artística e da poesia.

“Quem tente a procura do essencial no escrever do poema responde a duas questões prementes. São elas: a natureza específica do discurso a que chamamos 'poesia' e o modo pelo qual esse discurso é encarado na atualidade.” (Castilho,2021, p.69)

Através de reflexões cuidadosas, Castilho explora os elementos essenciais da poesia, como a precisão das observações e o alcance das propostas. A variedade de opções interpretativas é uma característica fascinante da poesia, e o autor nos convida a explorar esse universo.

A concisão do estilo de escrita de Castilho permite que suas análises penetrem no cerne da arte poética. Ao ler “Arte Poética”, somos convidados a refletir sobre a linguagem, as imagens e as emoções que permeiam a poesia. É uma jornada enriquecedora para todos aqueles que apreciam a beleza das palavras e a profundidade da expressão literária. “Arte Poética” é uma obra que nos inspira a olhar além das palavras e a descobrir a magia que reside na criação poética. É um convite para explorar o mundo interior e a conexão entre a linguagem e a alma humana.

Partindo para análise da cantiga “João Airas de Santiago”:

Trata-se de uma cantiga de amigo de João Airas de Santiago, trovador galego-português. O poema exprime a lealdade e o amor do eu-lírico para com o seu amigo, numa linguagem e estrutura simples. Tem uma métrica troque e alternada, e um esquema de rimas AAABBB. O refrão "dizede-lhi que mente" é utilizado para realçar o tema da lealdade. O poema exemplifica a tradição trovadoresca de utilizar a linguagem e as experiências quotidianas para transmitir emoções fortes. Em comparação a cantiga, “Ondas do mar de Vigo,”. A linguagem é simples, direta e emocional, com o uso de exclamações que enfatizam a expressão de sentimentos. A repetição da pergunta "e ai, Deus, se verrá cedo?" no final de cada estrofe cria uma sensação de ansiedade e urgência. Ambas as cantigas do texto são exemplos da poesia trovadoresca galego-portuguesa e demonstram a utilização da linguagem quotidiana para transmitir emoções fortes. No entanto, existem diferenças entre as duas. A cantiga de amigo de João Airas de Santiago exprime lealdade e amor para com um amigo numa linguagem direta, enquanto "Ondas do mar de Vigo" adopta uma abordagem metafórica, utilizando o imaginário das ondas do mar para exprimir emoções de amor e saudade. Embora ambos os poemas utilizem refrãos para dar ênfase, o esquema de rimas da cantiga de Santiago é AAABBB, enquanto a cantiga anónima utiliza uma estrutura simples e exclamações repetitivas para criar um impacto emocional. Geralmente, ambos os poemas são exemplos significativos da tradição trovadoresca galego-portuguesa, com abordagens únicas para transmitir emoções através da linguagem e da estrutura.

Cantiga "Amei-vos sempr', amigo, e fiz-vos lealdade" de João Airas de Santiago, o conteúdo, gira em torno de temas como o amor, a devoção, a lealdade e a calúnia. O eu-lírico exprime o seu amor e lealdade inabaláveis para com o amigo, sublinhando a força da sua ligação, apesar de quaisquer dúvidas ou rumores que possam ser espalhados por outros.  Também está confiante na sua própria verdade, implicando que qualquer pessoa que questione o seu amor pelo amigo está a mentir. A utilização do esquema de rimas acrescenta uma qualidade musical ao poema, que é uma caraterística da cantiga de amigos. Em geral, reflete a importância de ligações profundas e significativas entre indivíduos, bem como o poder da confiança, lealdade e honestidade nas relações.

A trova “Amei-vos sempr’, amigo, e fiz-vos lealdade” de João Airas de Santiago pode ser analisada, considerando o contexto histórico e literário em que foi escrita, bem como a estrutura e o estilo da cantiga. O discurso do poema gira em torno de temas como o amor, a lealdade, a devoção e a defesa contra a difamação. O eu-lírico, que é feminina, como é habitual nas trovas, declara o seu amor e lealdade inabaláveis ao amigo, independentemente dos boatos e dúvidas que possam ser espalhados por terceiros.  Afirma também a sua própria honestidade e pureza de intenções, sugerindo que quem questiona a sinceridade dos seus sentimentos está a mentir. Este discurso é caracterizado pelo uso de uma linguagem simples e repetitiva e por um tom direto e emotivo, que são representativos.  O discurso da cantiga enfatiza a importância de ligações profundas e significativas entre indivíduos, bem como o poder da confiança, lealdade e honestidade na promoção e manutenção dessas ligações.

A trovas de Santiago, centra-se nos temas do amor, da lealdade e da veracidade. O poema tem uma qualidade emotiva poderosa, eu-lírico a exprimir o seu amor profundo e inabalável por um amigo e o seu empenho em defender a sua honra contra quaisquer acusações caluniosas. A repetição da frase "dizede-lhi que mente" enfatiza a força da convicção da voz lírica e a sua vontade de defender o seu amigo. Além disso, apresenta uma voz feminina e temas de amor e saudade, aumenta o impacto emocional do poema.  Cantiga de amigo "Amei-vos sempr', amigo, e fiz-vos lealdade" é uma bela e comovente expressão de amor, lealdade e verdade que continua a ter eco junto dos leitores de todas as culturas e épocas.

Em suma, tradição trovadoresca galaico-portuguesa produziu um rico corpus de poesia que celebrou a vida emocional e cultural do período medieval. Através das cantigas de amigos e de outras formas de poesia, trovadores expressaram o seu amor, lealdade e saudade através de uma linguagem e estrutura simples. Estes poemas continuam a ser exemplos significativos de uma tradição literária que ajudou a desenvolver as línguas portuguesa e galega e moldou a identidade cultural da região. Atualmente, podemos apreciar e aprender como estas trovas, que oferecem uma visão única da riqueza emocional do período medieval e do poder duradouro das emoções e experiências humanas.


 


 Referências


 

PAIS, C.C. “Arte poética” IN: Canto português. Lisboa: Ed. Gandaia, 2021 (p. 69-72). O texto será disponibilizado para a turma em formato PDF, em 04/4/24.

 

SEIXAS, Cid. “Introdução” à O TROVADORISMO. Parte I: Crítica e Apuração de Textos. (p.15-21). Disponível em trovadorismo1.pdf (ufba.br). Acesso em 6/3/24. O texto será disponibilizado para a turma em formato PDF, em 04/4/24.

 

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