A resenha foi escrita por Lediane Santos Souza e estou compartilhando.
Leia a resenha sobre "As Três Marias" de Rachel de Queiroz, onde Lediane explora a vida das protagonistas Maria Augusta, Maria José e Maria da Glória, destacando os desafios da juventude no Nordeste brasileiro.
Ela analisa o contexto histórico e social da obra, discutindo a influência do modernismo e a importância de Rachel de Queiroz na literatura brasileira. Lediane oferece uma visão perspicaz e detalhada, homenageando a autora e revelando suas próprias habilidades críticas.
Você pode encontrar este trabalho no blog Leitores do Mundo para Leitores das Letras.

“Fala-se muito na crueldade e na bruteza do homem medievo. Mas o homem moderno será melhor?” (Rachel de Queiroz).
O Modernismo movimento artística/literário alcança o reconhecimento após a Semana de Arte Moderna em 1922, traz grandes novidades e rupturas com os padrões românticos que predominavam. Nossos artistas brasileiros desejavam romper com a imitação do vanguardismo europeu, alcançando assim uma identidade genuína brasileira. Durante esse movimento grandes expoentes surgiram: Oswald de Andrade, Mario de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, João Guimarães Rosa, Clarice Lispector, João Cabral de Melo Neto e tantos outros considerados e exaltados.

O objetivo aqui é analisar a obra “As três Marias” de Rachel de Queiroz, que foi considerada assim como outras/outros, influenciadora de uma época. A resenha proposta aqui relaciona como o feminino aparece no romance de Rachel de Queiroz, e a crítica feito ao romance por outro grande expoente do modernismo: Mário de Andrade.

Rachel de Queiroz mulher cearense, nascida em 1910 em Fortaleza, no dia 17 de novembro. Em 1917 sua família foge da seca em busca de novas oportunidades, passam por vários locais, Belém e depois de um tempo retornam ao Ceara. Desde muito nova engajar em produções em jornais revistas e com pouco mais de dezesseis anos publica o “O quinze” (1930), onde foi aceito em parte pela critica, pois acreditavam que Rachel de Queiroz era apenas um pseudônimo para esconder a identidade do verdadeiro autor, que achavam tratar-se de um homem. A escrita forte e moderna faz esgotarem os exemplares do primeiro livro da autora e após uma segunda leva manda o para são Paulo e rio de janeiro onde alcança novos autores entre Mario de Andrade que faz uma critica favorável a escrita de Rachel, não deixando de ser preconceituosa, ele dizia que tal obra nem parecia ser escrita por uma mulher nova. Desmerecendo o talento da autora. Rachel não se abate e em 1939 lança seu terceiro romance “As três Marias”, obra que aqui será discutida.
O lançamento do livro culmina em uma nova fase da autora, que apesar de não se considerar feminista mostra ao longo de sua narrativa seus anseios e sonhos em relação ao papel social da mulher, ainda mais aliado ao fato de seu romance tratar de ser um texto autobiográfico como muitos estudiosos defendem.
As três Marias iniciam a sua saga em um internato dirigido por freiras, o apelido é dado às três meninas: Maria Augusta (Guta), Maria da Glória, Maria José. À noite deitadas no gramado se reconhecem na constelação da qual originam seus nomes, a estrela de cima é Maria da Glória, resplandecente e próxima. “Maria José se identifica com a da outra ponta, pequenina e trêmula. A do meio, serena e de luz azulada, é Maria Augusta – ou simplesmente Guta, como sempre preferiu ser chamada”.
(…) nossa comparação com as estrelas foi como uma embriaguez nova, um pretexto para fantasias, e devaneios. (…) À noite, ficávamos no pátio, olhando as nossas estrelas, identificando-nos com elas. Glória era a primeira, rutilante e próxima. Maria José escolheu a da outra ponta, pequenina e tremente. E a mim me coube a do meio, a melhor delas, talvez; uma estrela serena de luz azulada, que seria decerto algum tranquilo sol aquecendo mundos distantes, mundos felizes, que eu só imaginava noturnos e lunares.
Guta é uma menina de doze anos, que é mandada ao internato por sua madrasta que trata- lhe bem, mas apesar disso envia-a ao internato. Guta perdeu a mãe cedo e chegar à nova escola cheia de expectativa e ao mesmo tempo saudades de casa.

“Na cama – tudo calado – (…) minha tristeza afinal explodiu, e chorei, chorei até esgotar todos os soluços, todas as lágrimas, chorei até dormir, exausta, desarvorada, rolando a cabeça dolorida, sem repouso, no travesseiro quente e duro.”
Assim com o passar do tempo Guta conhece as outras duas Maria Jose e Maria da gloria, elas criam laços de amizade dividindo experiências e esperanças de uma vida melhor. O tempo passa e todas tornam se adultas, elas têm quê agora lidar com a dureza da realidade.
Cada Maria tem uma personalidade e apesar da amizade entre elas cada uma segue um caminho. Guta que é quem narra toda a história retorna para casa, mas não se contenta com os afazeres da casa e anseia pela liberdade. Gloria segue os padrões sociais, impostos a mulher e casa-se, então seu destino cabe servir ao marido e filho em uma vida monótona. Maria José entrega-se a vida religiosa longe de qualquer prazer da vida e do mundo torna se uma mulher regrada e cheia de tabus.
Maria augusta, Guta não conhece o casamento e nem tão pouco agradou se da vida religiosa, “seu lema era ser livre do casamento e religião”, queria sua vida como os romances que lia na infância, mas o descaso dos homens com seus sentimentos a fazia sentir se cada vez mais solitária.
Nossa protagonista se ver querendo alçar vôos e ver na partida de sua casa como pista de decolagem para uma nova vida, assim vai para fortaleza e inicia seu trabalho em um jornal como datilógrafa e ver a felicidade dar sinais, contudo com o passar do tempo aquilo já não a satisfaz mais, pois era da casa par o trabalho e vice versa. Mesmo se vendo como dona de si ela e vencida pela monotonia mais uma vez.
“Comecei a trabalhar. E parecia-me que a felicidade começava. Viver sozinha, viver de mim, viver por mim, livrar-me da família, livrar-me das raízes, serem sós, ser livre!” Pág.: 52.
Guta queria conhecer os prazeres do mundo. Passa por vários indagações e conflitos internos, nossa heroína que a toda tempo aproxima da autora, Rachel, vai mora com Mara Jose, onde conhece Raul, homem, mas velho que queria apenas uma amante e que tem um encontro violento com Guta o que a faz recuar deste relacionamento de certa forma abusivo.
Passados vários empecilhos, Guta foge ao saber que seu amigo Aluísio comete suicídio e diz em carta que foi por causa dela. Ela segue para o Rio de Janeiro onde novamente experimenta o sentimento de incompletude… Até que conhece Isaac; ele devolve a Guta uma felicidade que a muito não sentia. Assim como tão importante a ele se entrega com todo o amor, mas como tudo na vida dura pouco e ela mais uma vez tem que retorna a Fortaleza para mesmo marasmo.
Nossa heroína adoece e perde aquilo que seria o seu pedacinho de Isaac e volta para o ponto de partida, sua casa no sertão. Seu ponto inicial.
Agora, apesar do final angustiante que deixa o leitor com uma ideia de impotência em relação ao destino, Rachel demonstra com sua escrita clara e objetiva os vários seguimentos sociais. Os papéis femininos de protagonismo em um momento histórico (1939), em que tratava as mulheres como algo menor, e em que os homens são jogados para o segundo plano, leva a ver que as temáticas da autora que mostra o papel da mulher como heroína e dona de si. Guta ao ir atrás de sua completude mostra que os únicos caminhos dedicados a mulher, o casamento a religiosidade ou a prostituição, podem e devem ser quebrados naquela época e ainda hoje.
A crítica social em relação ao patriarcado na sociedade não foi visto com bons olhos por muitos homens, um deles considerado importante para o modernismo. Mario de Andrade, que anteriormente havia exaltado a obra de Rachel, nesse momento desmerece a obra fazendo critica a feminilidade com a qual Queiroz, ele afirma que:
“Outro dado importante da feminilidade do livro é uma tal ou qual fraqueza vingativa no analisar os homens e buscar compreendê-los com maior exatidão. Não nos esqueçamos, no entanto, que se trata da mesma artista que desenhou “João Miguel” com tão poderosa humanidade. Mas agora afirma coisas assim: “Talvez os homens usem as ternuras do amor como empregam os “encantado em conhece-la” na rua.” […] é verdade que a analista põe tudo num dubitativo inquieto, mas não será este o único instante em que ela se vinga do eterno masculino, lhe penetrando pouco ou mal a incapacidade de grandeza.” Pág.: 62.

Ao lermos a crítica vemos concentrados os desmandos da sociedade que caem sobre a mulher, ao passo que os papéis masculinos tratados colocaria Raquel em seu romance como vingativa, Mário deixa claro o seu ego masculino machucado, dolorido por tamanho do protagonismo da mulher, que mostra toda feminilidade e força independente dos processos, que limitam a mulher, mostrando uma nova perspectiva em que nem toda mulher o casamento e ter filhos será o único caminho, assim Andrade e volta atrás em relação a crítica que faz anteriormente e desconsidera o papel social da obra. A crítica de Mário de Andrade traz discussões a que ocorre até a atualidade, quando o feminismo combate o patriarcado e toda forma de violência seja ela física ou psicológica, ele trata do parto como se fosse algo simples e critica o que é caracterizado por Rachel como vemos a seguir:
“O parto parece estar para a escritora em íntima conivência com a morte. Aliás, para Maria Augusta, que é quem conta a história, essa ligação do parto com a morte é impressionante legítima, pois que ela perde o filhinho nascituro.”
Embora as críticas tiveram papel importante, por confirma a visão de Rachel em relação à sociedade, ler “As três Marias” com olhos afinados para o papel da mulher.
Esse romance não tem apenas valor literário, mas também valor histórico social, e um marco na nossa literatura brasileira. Recomendo a leitura que se faz fácil com linguagem clara, direta levando ao conhecimento o final dos personagens ate onde possível.
Referências Bibliográficas:
MORICONI, Ítalo. Como e por que ler a poesia brasileira do século XX. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.
ANDRADE, M. de. O Empalhador de Passarinhos. Belo Horizonte: Itatiaia, 2002.
QUEIROZ, Raquel. De. As Três Marias. Ceará: José Olympio, 1939.
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