terça-feira, 7 de outubro de 2025

AREIA MOVEDIÇA



Sou areia movediça —

cada passo meu afunda um pouco mais,

e o chão que me segurava já não tem pressa em salvar.

A pele raspa no silêncio dos grãos,

e eu vou cedendo — devagar, sem alarde —

até que o peso vira costume e o susto, memória.

Quero que tudo acabe como quem fecha um livro:

sem epílogo prolongado, sem visitas à cena do crime.

Que a página vibre só o tempo do último ponto,

que o resto se dissolva em pó e vento.

Não quero fogo nem heróis; só um fim simples,

uma linha final que me permita finalmente silenciar.

Me misturo ao lugar que me consome,

e meus dedos já não encontram bordas.

Peço por um término honesto,

por um fim que não me force a fingir que não afundo.

Deixa que a terra me tome inteira —

sem espetáculo, sem plateia, só o abraço frio do último instante.

Sou areia. Sou quedas repetidas.

E, por ora, só desejo que algo termine.

Que o afundar tenha fim — e não mais recomeço.

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